A primeira ilegalidade apontada por Marsiglia diz respeito ao descumprimento de uma ordem dada à plataforma para bloquear e impedir que o perfil de Allan dos Santos permanecesse ativo. O jurista considera que essa atitude caracteriza uma violação da liberdade de expressão, uma vez que bloquear o perfil de um usuário, bem como impedir a criação de um novo canal, configura uma forma de censura, que é expressamente vedada pela Constituição Federal e por decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal (STF).
O segundo e o terceiro pontos, para Marsiglia, referem-se diretamente a esse ato de censura. A suspensão de um perfil e a proibição de um futuro canal se encaixam no que a própria corte entende como censura prévia, uma prática considerada inconstitucional e incompatível com a liberdade de expressão garantida pela Constituição.
Outro ponto de crítica do jurista é a forma como a intimação foi feita. Moraes afirmou que houve uma intimação ao advogado da Rumble para que a plataforma bloqueasse o perfil de Allan dos Santos e indicasse um representante legal no Brasil. Marsiglia, no entanto, argumenta que a intimação deveria ter sido feita diretamente à parte responsável pela empresa, e não ao advogado, conforme estabelece a legislação brasileira. A súmula 410 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) prevê que esse tipo de obrigação de fazer seja dirigido à parte, e a ausência de um representante legal no Brasil implicaria a necessidade de uma carta rogatória para a empresa, com sede nos Estados Unidos.
Além disso, Moraes fundamentou sua decisão na alegação de que a Rumble desrespeitou a soberania nacional ao não cumprir as ordens. No entanto, Marsiglia defende que as ordens proferidas sequer seguiram os trâmites legais, o que torna qualquer tentativa de cumprimento inválida e, consequentemente, não há o que ser desrespeitado. Isso, para o jurista, constitui mais uma ilegalidade no processo.
No aspecto das plataformas privadas, Marsiglia destaca que, apesar de serem empresas privadas, essas plataformas têm um papel público importante, pois garantem a circulação de opiniões e a liberdade de expressão de milhares de pessoas. Portanto, a suspensão de uma plataforma como a Rumble seria desproporcional, visto que ainda existem alternativas para garantir a liberdade de expressão. E novamente, ele reflete que as ordens para suspensão da plataforma não estavam devidamente fundamentadas no trâmite legal, o que, em sua opinião, configura mais uma ilegalidade.
Outro ponto crucial abordado por Marsiglia diz respeito ao conceito de crime de desobediência. Moraes alegou que a Rumble teria cometido esse crime ao desobedecer a ordem de bloquear o perfil de Allan dos Santos. No entanto, segundo o jurista, o crime de desobediência só pode ser configurado quando o descumprimento da ordem não resulta em uma sanção específica. Marsiglia cita o artigo 774, IV do Código de Processo Civil (CPC), que determina que, no caso de descumprimento de uma ordem, a única sanção prevista é a aplicação de multa, e não a suspensão da plataforma, como decidiu o ministro.
Moraes também justificou sua decisão com base em uma suposta incitação de ódio contra o STF por parte do dono da Rumble, o que teria reforçado sua decisão de suspender a plataforma. Porém, o jurista refuta esse argumento, pois não existe no ordenamento jurídico brasileiro um tipo penal específico para incitação de ódio contra uma instituição como o STF, tornando essa alegação inválida.
Por fim, Marsiglia contesta a decisão de Moraes que determinou que a Anatel fosse intimada para suspender os serviços da Rumble, algo que, segundo ele, também não tem respaldo legal. O jurista considera a intimação da Anatel por e-mail uma medida ilegal, uma vez que deveria ser cumprida uma obrigação de fazer com base em uma intimação adequada.
Dessa forma, Marsiglia conclui que a decisão de Moraes foi repleta de ilegalidades, e que a atuação do ministro representa mais um episódio de abuso de poder, que coloca em risco a democracia e a liberdade de expressão no Brasil. Essa visão é compartilhada por muitos críticos do governo atual, que veem essa decisão como parte de uma série de medidas autoritárias que visam controlar o fluxo de informações e restringir as opiniões divergentes.
Esse episódio é apenas mais um capítulo na crescente pressão contra a liberdade de expressão e as plataformas independentes no Brasil, e as reações jurídicas e políticas devem se intensificar nos próximos dias, com possíveis desdobramentos tanto no cenário nacional quanto internacional.