A decisão de manter silêncio institucional do STF é uma tentativa de não acirrar ainda mais os ânimos, já que a medida americana, além de econômica, tem um claro viés político. Apesar do acordo para que o Supremo permanecesse discreto, o ministro Flávio Dino publicou uma mensagem nas redes sociais em que exaltou a importância do tribunal na defesa da soberania nacional. Sem citar diretamente a medida de Trump ou o agravamento da crise diplomática, Dino afirmou que é uma honra fazer parte do STF, instituição que, segundo ele, atua com seriedade na proteção da democracia, das liberdades e da soberania, sempre conforme a Constituição e as leis brasileiras.
O gesto foi interpretado como uma sinalização indireta diante da pressão internacional crescente. Desde maio, os Estados Unidos já vinham emitindo recados explícitos contra o STF. Naquele mês, o secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, anunciou que o país iria impor restrições de entrada a estrangeiros envolvidos em censura contra cidadãos americanos. A declaração foi entendida como uma referência direta ao ministro Alexandre de Moraes, frequentemente acusado por figuras conservadoras nos EUA de liderar um processo de repressão contra vozes de direita e contra plataformas digitais norte-americanas que acolhem esses conteúdos.
Agora, com a tarifa de 50% prestes a entrar em vigor no dia 1º de agosto, a tensão atinge um novo patamar. A medida afeta todas as exportações brasileiras de forma ampla e, segundo o próprio Trump, pode ser ampliada caso o governo Lula decida adotar qualquer tipo de retaliação. Em resposta, o Itamaraty já acionou mecanismos diplomáticos para tentar reverter a decisão, mas até o momento, a Casa Branca tem se mostrado inflexível.
Nos bastidores do Supremo, ministros ouvidos em caráter reservado admitem que o movimento dos Estados Unidos pode se intensificar ainda mais nos próximos meses, especialmente com a aproximação do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, previsto para ocorrer entre o fim de agosto e o início de setembro. A avaliação interna é de que o cerco internacional pode ter como objetivo influenciar politicamente o clima no Brasil, mas, segundo os magistrados, isso não será suficiente para impedir o andamento do processo judicial contra o ex-chefe do Executivo.
Ainda segundo apuração do jornal paulista, os ministros reconhecem que a crise ganhou uma dimensão inédita e que há preocupação com os impactos econômicos e políticos que a tarifa de Trump pode gerar. Ao mesmo tempo, avaliam que seria um erro ceder a qualquer tipo de intimidação externa, reforçando a importância de manter a independência dos Poderes, mesmo em tempos de forte pressão internacional. Há também a percepção de que o Judiciário brasileiro virou alvo preferencial de figuras ligadas ao Partido Republicano nos Estados Unidos, principalmente por conta da atuação do STF em casos ligados à liberdade de expressão e à disseminação de desinformação em redes sociais.
Enquanto isso, o setor empresarial brasileiro observa a situação com apreensão. Representantes da Amcham Brasil, entidade que reúne empresas brasileiras e americanas, já alertaram para a possibilidade real de perda de empregos em razão da medida tarifária, especialmente em setores voltados à exportação. A entidade defende uma solução diplomática urgente e teme que o prolongamento da crise afaste investidores estrangeiros e afete a recuperação econômica do país.
A crise entre Brasil e Estados Unidos, que começou com um discurso de Trump em defesa de Jair Bolsonaro, agora se transforma em um impasse que mistura economia, política e diplomacia. Lula tenta conter os danos com apoio do Itamaraty, enquanto o Supremo opta por não entrar no confronto direto, apesar das provocações e ameaças veladas. O desfecho ainda é incerto, mas o episódio já deixou evidente que a tensão entre as duas nações dificilmente será resolvida sem consequências profundas para o cenário interno brasileiro.