Mendonça finalmente toma atitude

LIGA DAS NOTÍCIAS

O Supremo Tribunal Federal está prestes a tomar uma decisão que pode transformar completamente o funcionamento das plataformas digitais no Brasil. Trata-se da análise da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, dispositivo que, desde a promulgação da lei, tem garantido certa proteção às empresas responsáveis por redes sociais e serviços de compartilhamento de conteúdo, como Google, Facebook e X, antigo Twitter. Segundo essa regra, as plataformas só podem ser responsabilizadas judicialmente por conteúdos publicados por terceiros se, após o recebimento de uma ordem judicial para remoção, deixarem de cumprir a determinação. Esse modelo tem servido como um importante mecanismo de equilíbrio entre liberdade de expressão e responsabilidade digital, mas pode estar prestes a ser substituído por uma abordagem mais rígida.


Com a eventual derrubada do artigo 19, abre-se a possibilidade de responsabilização das plataformas sem necessidade de ordem judicial prévia. Isso significa que bastaria que um conteúdo fosse considerado ilegal ou ofensivo por alguém para que a empresa pudesse ser processada ou obrigada a removê-lo imediatamente. Esse novo modelo tem gerado preocupações entre defensores da liberdade de expressão, que enxergam na mudança uma porta aberta para censura prévia e excessiva, além de um incentivo à moderação automática e desproporcional de conteúdo por parte das empresas, que podem optar por remover publicações para evitar riscos judiciais, mesmo que essas postagens não violem leis.


A movimentação ganhou um novo elemento quando, no mesmo dia em que o ministro André Mendonça devolveu o processo ao plenário do STF, a Advocacia-Geral da União protocolou uma ação pedindo que a Corte reconheça a responsabilidade das plataformas pela disseminação de desinformação e discursos de ódio. A AGU argumenta que as empresas têm se mostrado omissas no combate a conteúdos perigosos, colocando em risco a segurança dos cidadãos e a estabilidade democrática. Para o órgão, é necessário adotar uma nova postura jurídica diante da ineficácia do modelo atual, que dependeria de decisões judiciais lentas e muitas vezes inoperantes frente à velocidade das redes.


A ação da AGU é vista por muitos como uma tentativa do governo de antecipar os efeitos da possível decisão do STF. Mesmo antes de o julgamento ser concluído, busca-se já estabelecer um novo entendimento sobre o dever das plataformas, pressionando-as a adotarem medidas de controle mais rígidas. Isso levanta questionamentos sobre o papel do Executivo na condução de pautas judiciais e sobre os riscos de interferência indevida em decisões que deveriam ser tomadas com ampla discussão pública e técnica.


O debate sobre o artigo 19 revela um dos maiores desafios da era digital: encontrar o ponto de equilíbrio entre garantir a liberdade de expressão e combater abusos nas redes. O modelo atual permite que as plataformas não sejam responsabilizadas automaticamente por conteúdos ofensivos ou ilegais, salvo se desobedecerem a ordens judiciais. Essa garantia funciona como um freio à censura e como proteção à pluralidade de opiniões. No entanto, os críticos desse sistema afirmam que ele não acompanha a velocidade com que a desinformação e os discursos extremistas se propagam, e que as plataformas deveriam ter mais responsabilidade preventiva.


Juristas e especialistas em direito digital estão divididos sobre a questão. De um lado, há os que defendem a manutenção do artigo 19 como essencial para a preservação de uma internet livre e democrática, onde as plataformas não sejam forçadas a decidir o que é certo ou errado sem amparo judicial. De outro, estão aqueles que acreditam que, diante do volume de crimes virtuais, é necessário exigir uma atuação mais proativa das empresas, inclusive com o uso de tecnologias avançadas de moderação e inteligência artificial.


A decisão do STF sobre o artigo 19 vai além do aspecto jurídico e entra no campo político e social. Ela representa uma escolha sobre qual tipo de sociedade o Brasil deseja construir no ambiente digital. Trata-se de definir até que ponto o Estado pode intervir no conteúdo publicado online e qual o grau de responsabilidade das empresas que hoje controlam os principais meios de comunicação da era moderna.


Caso o Supremo decida pela derrubada do artigo, os efeitos serão profundos e imediatos. As plataformas poderão passar a remover preventivamente conteúdos de usuários para evitar riscos legais, o que pode impactar negativamente a liberdade de expressão. Ao mesmo tempo, a decisão pode estabelecer uma nova referência internacional sobre como os países devem lidar com o poder das big techs. Em um cenário de crescente pressão global por regulação, o Brasil poderá ser visto como um exemplo a ser seguido ou um alerta sobre os perigos de um controle excessivo.


Nos próximos meses, o julgamento será retomado, e seus desdobramentos serão acompanhados com atenção não apenas por juristas, parlamentares e empresas de tecnologia, mas por milhões de brasileiros que, diariamente, utilizam as redes sociais como espaço de informação, opinião e convivência. O que está em jogo é o futuro da internet no país e os contornos da democracia na era digital.


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