Freire Gomes prestou depoimento como testemunha no inquérito que investiga supostas tentativas de golpe e articulações ilegais no entorno do ex-presidente no período de transição governamental. Em determinado momento do depoimento, Moraes levantou a possibilidade de que o general teria cogitado prender Bolsonaro, informação baseada em uma interpretação da chamada minuta de Garantia da Lei e da Ordem, a GLO, que circulou naqueles dias tensos. A resposta do militar foi direta: nunca houve qualquer voz de prisão contra o então presidente. Ele ainda afirmou que a minuta foi superdimensionada e que sequer tratou o documento como algo de relevância prática.
A negativa de Freire Gomes não foi bem recebida por Moraes, que elevou o tom da audiência. O ministro, visivelmente contrariado, sugeriu que o general estaria mentindo em juízo ou que havia prestado falso testemunho anteriormente à Polícia Federal. A pressão foi explícita. Moraes disse que o general deveria pensar muito bem antes de continuar seu depoimento, dando-lhe, nas palavras do próprio magistrado, uma “segunda chance” para dizer a verdade. O general, por sua vez, respondeu sem titubear. Disse que nunca mentiria, especialmente após meio século de serviços prestados às Forças Armadas. A frase reverberou imediatamente, deixando clara a firmeza do depoente diante da insinuação de que estaria cometendo crime de falso testemunho.
Pouco depois da audiência, Bolsonaro foi às redes sociais. Em sua conta no X, comentou o episódio de forma curta, mas contundente. Escreveu: “Mais um que manda mais mentiras pra latrina.” A mensagem, embora breve, foi interpretada como um ataque direto à versão propagada por Moraes e à narrativa que sustenta a tese de uma conspiração militar para manter Bolsonaro no poder após as eleições de 2022. O ex-presidente não citou nomes, mas o contexto deixou evidente que sua crítica mirava os relatos que tentam associá-lo a um suposto plano de ruptura institucional.
O apoio de Bolsonaro ao general Freire Gomes foi implícito, mas poderoso. A publicação foi rapidamente compartilhada por seus apoiadores e repercutiu em diversos grupos conservadores, que celebraram a firmeza do militar diante do que classificam como arbitrariedades do Judiciário. O gesto também reforçou a ideia de que Bolsonaro continua a contar com respaldo em setores das Forças Armadas, mesmo após deixar o cargo.
O depoimento de Freire Gomes e a reação de Bolsonaro voltaram a acirrar os ânimos no meio político. Parlamentares da oposição criticaram a postura de Moraes, acusando o ministro de intimidar testemunhas em vez de agir como um magistrado imparcial. Já aliados do governo e defensores das investigações sustentam que o rigor adotado é necessário diante da gravidade das suspeitas.
A cena em que o general rebate a acusação com a frase “com 50 anos de Exército, eu nunca mentiria” viralizou nas redes sociais, transformando-se rapidamente em símbolo de resistência para os que veem o STF como agente de perseguição política. Muitos internautas resgataram vídeos antigos de Freire Gomes em eventos oficiais, enaltecendo sua trajetória e ressaltando sua postura institucional ao longo dos anos.
Enquanto isso, o Supremo Tribunal Federal continua sendo pressionado a explicar os rumos da investigação. A insistência em explorar a narrativa da minuta da GLO como prova de conspiração tem sido criticada até mesmo por juristas independentes, que apontam fragilidade no uso de rascunhos como base para incriminar figuras públicas sem evidências de ações concretas.
O pronunciamento de Bolsonaro é mais um episódio de um embate em curso entre o ex-presidente e setores do Judiciário. Ao se manifestar rapidamente após a audiência, ele reforçou seu posicionamento de que há uma tentativa de criminalizar seu governo e seus aliados por meio de interpretações forçadas e uso político de processos judiciais. O caso, que já era sensível, ganha novos contornos com o levante do general diante de Moraes e com o endosso, ainda que indireto, de Bolsonaro ao seu ex-comandante do Exército.
A tensão institucional segue em alta, e o Brasil continua assistindo a capítulos cada vez mais acirrados da disputa entre o Judiciário, as Forças Armadas e os remanescentes do governo anterior. Com as redes sociais amplificando cada gesto, cada frase e cada reação, o cenário político permanece polarizado e imprevisível.