O Brasil enfrentou em 2024 o maior déficit nas contas externas desde 2019, com um aumento significativo no saldo negativo das transações correntes. O Banco Central divulgou nesta sexta-feira, 24, que o déficit atingiu US$ 56 bilhões, o que representa 2,55% do Produto Interno Bruto (PIB), mais que o dobro do valor registrado no ano anterior, quando o rombo foi de US$ 24,5 bilhões, equivalente a 1,12% do PIB. Esse resultado é o pior nos últimos cinco anos, superando até mesmo o déficit de 2019, quando o país enfrentou um rombo de US$ 65 bilhões, o que representava 3,47% do PIB.
O aumento substancial do déficit em 2024 é atribuído a dois fatores principais. Em primeiro lugar, houve uma queda significativa no superávit da balança comercial, que diminuiu em US$ 26,1 bilhões em comparação a 2023. A balança comercial, que mede a diferença entre exportações e importações, foi pressionada pela desaceleração das vendas externas e pelo aumento das importações, especialmente em áreas como combustíveis e produtos industrializados. Esse declínio na balança comercial foi o principal responsável pela maior parte do aumento do déficit em conta-corrente.
Além disso, a balança de serviços também registrou um aumento considerável no déficit, que cresceu em US$ 9,8 bilhões. A conta de serviços abrange itens como transportes, turismo e pagamentos por royalties e licenças, e o crescimento do déficit nessa categoria reflete tanto a maior saída de recursos do país quanto a diminuição das receitas, em parte devido à queda no turismo internacional e ao aumento das despesas com transportes e pagamentos de serviços financeiros ao exterior.
Apesar da expansão do déficit, o Brasil contou com um apoio significativo dos investimentos estrangeiros diretos, que superaram o saldo negativo das transações correntes. Em 2024, os investimentos diretos no país (IDP) totalizaram US$ 71,1 bilhões, representando 3,24% do PIB. Esse montante foi 13,8% maior do que o registrado em 2023, quando os investimentos foram de US$ 62,4 bilhões, ou 2,85% do PIB. Esse aumento na entrada de recursos no Brasil, principalmente na forma de investimentos em empresas e ativos produtivos, foi suficiente para financiar o déficit em conta-corrente e ainda gerar um fluxo positivo de capitais no país.
O superávit obtido com os investimentos diretos foi uma das principais razões pelas quais o Brasil não enfrentou uma crise cambial ou uma pressão ainda maior sobre suas reservas internacionais, mesmo diante do aumento do déficit nas contas externas. Esse fluxo de investimentos é um reflexo da confiança de investidores estrangeiros na economia brasileira, embora o cenário global ainda seja de grande incerteza, especialmente em relação às taxas de juros mais altas nos principais mercados internacionais, como os Estados Unidos.
Além disso, houve uma redução de US$ 4,1 bilhões no déficit de renda primária, que engloba as transferências de lucros e dividendos para o exterior. Esse alívio foi parcial, mas ajudou a mitigar a pressão sobre a balança de pagamentos. Já o superávit de renda secundária, que inclui as transferências de recursos entre o Brasil e o exterior, teve um pequeno crescimento de US$ 367 milhões, o que também contribuiu para atenuar o impacto negativo do déficit nas contas externas.
O aumento do déficit nas transações correntes reflete uma série de desafios estruturais para a economia brasileira. A desaceleração nas exportações e o aumento das importações são indícios de que o Brasil enfrenta dificuldades em seu setor externo, o que pode afetar a sustentabilidade das contas externas a médio e longo prazo. Além disso, o aumento do déficit de serviços destaca a vulnerabilidade do país em termos de pagamentos para o exterior, especialmente em um cenário de recuperação econômica global mais lenta.
Por outro lado, o crescimento dos investimentos diretos é um sinal positivo, pois demonstra que, apesar das dificuldades internas, o Brasil ainda é visto como um destino atrativo para os investidores. Isso sugere que o país possui um potencial de recuperação econômica, desde que consiga equilibrar suas contas externas e implementar políticas econômicas que favoreçam o aumento da competitividade de suas exportações e a redução da dependência de importações.
A situação das contas externas em 2024 coloca em evidência a necessidade de reformas estruturais no Brasil para garantir um crescimento sustentável e reduzir a vulnerabilidade do país a choques externos. A combinação de um aumento no déficit em conta-corrente com o crescimento dos investimentos diretos pode ser uma oportunidade para impulsionar reformas que melhorem a balança comercial e fortaleçam a posição do Brasil no comércio global. No entanto, será necessário que o governo e as autoridades econômicas do país ajam com celeridade para enfrentar os desafios impostos por esse quadro macroeconômico e buscar o equilíbrio nas contas externas nos próximos anos.