O projeto de lei, que tem gerado intensa discussão dentro e fora do Congresso, visa conceder anistia às pessoas que participaram dos atos antidemocráticos realizados em Brasília no início do ano passado. Na ocasião, manifestantes invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, contestando o resultado das eleições presidenciais de 2022 e reivindicando a destituição do governo eleito. Desde então, milhares de pessoas foram presas ou estão sendo processadas, o que motivou a apresentação de uma proposta para discutir a possibilidade de perdão judicial para parte dos envolvidos.
O requerimento de urgência apresentado nesta segunda-feira reuniu inicialmente 264 assinaturas de deputados, número superior ao mínimo exigido para que a matéria possa ser incluída diretamente na pauta do plenário da Câmara, sem a necessidade de tramitação prévia nas comissões temáticas. No entanto, após uma revisão formal, duas assinaturas foram invalidadas por questões técnicas, reduzindo o número total de apoiadores a 262.
Apesar da ampla adesão dentro da bancada do PL, considerada uma das mais alinhadas com o ex-presidente Jair Bolsonaro, a ausência da assinatura de Antonio Carlos Rodrigues chamou atenção por ser um ponto fora da curva. O parlamentar, que tem um histórico político marcado por alianças com diferentes espectros ideológicos, inclusive tendo ocupado o cargo de ministro dos Transportes durante o segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, evitou, ao menos até o momento, se posicionar publicamente sobre o tema. A reportagem procurou o gabinete do deputado para obter esclarecimentos sobre sua decisão, mas não obteve resposta.
A divergência dentro da bancada do PL, ainda que pontual, revela que o projeto de anistia não conta com unanimidade nem mesmo entre os aliados mais fiéis ao bolsonarismo. A proposta tem sido defendida por grupos de direita e extrema direita como uma forma de reverter o que classificam como perseguição política contra cidadãos que, segundo eles, apenas exerceram o direito de protestar. Por outro lado, críticos argumentam que a anistia pode representar um perigoso precedente, incentivando futuros ataques à ordem democrática sob a expectativa de impunidade.
A discussão em torno da urgência da proposta ocorre em um momento de crescente polarização no Congresso Nacional, com bancadas progressistas e de centro articulando estratégias para tentar barrar ou ao menos adiar a votação. Lideranças de partidos como o PT, PSOL e Rede já manifestaram publicamente sua oposição ao projeto, alertando para o risco de enfraquecimento das instituições e da credibilidade do sistema judiciário.
Além disso, há uma expectativa de que o Supremo Tribunal Federal (STF) acompanhe de perto a tramitação do projeto, visto que a Corte foi diretamente afetada pelos ataques de 8 de janeiro. O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, já afirmou em ocasiões anteriores que qualquer tentativa de anistiar os envolvidos nos atos poderá configurar um desrespeito à Constituição e aos valores democráticos do país.
Enquanto isso, no campo político, o projeto de lei de anistia tende a se tornar um novo ponto de atrito entre o governo federal e a oposição, além de potencializar divisões internas em legendas com diferentes correntes ideológicas. A base governista avalia que a concessão de anistia enfraqueceria a resposta institucional aos atentados, enquanto setores da oposição veem na proposta uma oportunidade de atender à base eleitoral que considera os detidos como presos políticos.
A tramitação do projeto de urgência deverá ser analisada pelo plenário da Câmara nos próximos dias. Caso aprovada, a proposta poderá ser votada diretamente, sem passar pelas comissões, acelerando o processo legislativo e ampliando o clima de tensão entre os parlamentares. Até lá, líderes partidários seguirão tentando costurar acordos e conquistar apoios, tanto a favor quanto contra a medida, numa disputa que promete continuar mobilizando o cenário político nacional.