Com 68 anos, Anderson é um repórter experiente que construiu sua reputação internacional ao cobrir figuras e contextos politicamente sensíveis. A escolha dele para traçar o perfil de Moraes causou surpresa, especialmente por seu histórico com personagens revolucionários e por suas posições ideológicas conhecidas. Durante o processo de apuração, o jornalista entrevistou Moraes duas vezes e teve acesso a informações e bastidores inéditos, o que culminou em uma reportagem que mistura tons de respeito e desconfiança, provocando interpretações diversas.
No conteúdo da entrevista, Moraes não economizou nas palavras. Ele apresentou uma postura de autoconfiança quase teatral ao descrever seu papel no Judiciário e na condução de investigações relacionadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro e aos acontecimentos do 8 de janeiro de 2023. Um dos trechos que mais chamou atenção foi quando Moraes afirmou que não poderia morrer, em tom de brincadeira, porque o “herói do filme tem que continuar”. A frase foi interpretada por muitos como uma demonstração de vaidade, enquanto outros viram nela um indicativo do peso que o próprio ministro atribui ao seu papel institucional.
No entanto, a entrevista ultrapassou o campo da retórica pessoal e adentrou temas que ainda estão em aberto no Judiciário, o que acendeu alertas entre analistas e opositores. Em um momento considerado delicado, Moraes comentou a situação de Jair Bolsonaro, afirmando que não acredita na possibilidade de reversão das condenações que hoje tornam o ex-presidente inelegível. Segundo ele, com duas decisões já emitidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, seria inviável qualquer reabilitação de Bolsonaro até 2026. Essa antecipação de julgamento, ainda que expressa de forma subjetiva, gerou críticas quanto à imparcialidade do ministro.
Outro ponto que causou polêmica foi a abordagem de Moraes sobre os atos de 8 de janeiro. Segundo ele, o objetivo dos manifestantes era provocar uma crise institucional de tal gravidade que obrigasse a intervenção do Exército. Essa narrativa reafirma a posição que o Supremo Tribunal Federal tem defendido desde o início das investigações, mas também reforça a visão de parte da sociedade que enxerga no Judiciário uma atuação política disfarçada de legalidade.
A publicação da entrevista veio acompanhada por imagens feitas pelo fotógrafo Fábio Setti, que, após breve exposição nas redes sociais, foram rapidamente removidas, o que gerou ainda mais especulação. Não se sabe se houve censura, pedido do próprio Moraes ou se foi uma decisão editorial. O fato é que o mistério em torno das fotos contribuiu para aumentar o interesse pelo conteúdo da matéria e pelo ambiente ao redor do ministro.
As reações à entrevista foram diversas e intensas. Em comentários online, internautas expressaram descrença, indignação e ironia diante da postura do ministro. Frases como “herói de que senhor?” e “o herói morre no final, derrubado pelo próprio povo” ilustram o clima de insatisfação. Muitos usuários destacaram o fato de Moraes nunca ter sido eleito pelo voto popular, o que intensifica o desconforto com o protagonismo que ele exerce no atual cenário político. Para esses críticos, o ministro representa uma espécie de guardião de um sistema que está cada vez mais distante da vontade popular.
A repercussão da entrevista ainda deve continuar, tanto no Brasil quanto no exterior. O perfil traçado por Anderson não apenas lança luz sobre a figura de Moraes, como também escancara a complexidade do momento político brasileiro. Em um país dividido e marcado por tensões institucionais, a figura do ministro do STF se torna símbolo de resistência para uns e de autoritarismo para outros. Ao escolher se expor em uma revista internacional de prestígio, Moraes reafirma seu papel central na arena política nacional, mas também aumenta os riscos de ser visto como um ator que ultrapassa os limites da toga.