Antes de chegar ao Congresso Nacional, um projeto semelhante já havia sido apresentado pela vereadora Amanda Vettorazzo na Câmara Municipal de São Paulo. O texto propunha que a prefeitura da cidade fosse impedida de apoiar, patrocinar ou divulgar eventos artísticos que envolvessem apologia ao crime. Embora o nome de Oruam não estivesse explicitamente citado na proposta, a vereadora afirmou publicamente que o objetivo era impedir que ele realizasse shows financiados pelo poder público em São Paulo.
Amanda argumentou que a iniciativa busca proteger crianças e adolescentes da influência de conteúdos que exaltam facções criminosas. Ela também afirmou que a prefeitura não deveria utilizar dinheiro público para promover artistas que tratam o crime como algo glamouroso. Em suas redes sociais, a vereadora foi ainda mais incisiva, declarando que o trapper promove letras que exaltam a violência, o tráfico de drogas e a criminalidade.
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, manifestou apoio à proposta de Amanda e disse que não conhece o trabalho de Oruam. Ele destacou que a vereadora não está atacando gêneros musicais específicos, mas sim questionando o uso de recursos públicos para artistas que fazem apologia ao crime. Segundo Nunes, a medida não se trata de um ataque ao funk ou ao trap, mas sim de um posicionamento contra o financiamento de mensagens que possam incentivar condutas criminosas.
A proposta, no entanto, gerou reações contrárias de parlamentares e ativistas culturais. A vereadora Ediane Maria, coordenadora da Frente Parlamentar do Funk, classificou o projeto como uma tentativa de criminalizar a cultura periférica. Para ela, sempre que manifestações artísticas ligadas à população negra e pobre ganham visibilidade, grupos conservadores tentam censurá-las.
O sociólogo e produtor de conteúdo Thiago Torres, conhecido como “Chavoso da USP”, também criticou a iniciativa e acusou o Movimento Brasil Livre (MBL), grupo político ao qual Kim Kataguiri pertence, de tentar silenciar artistas que falam sobre a realidade das periferias. Ele afirmou que Oruam está sendo perseguido não por suas músicas, mas pelo fato de ser filho de um homem que cumpre pena na prisão. Para o sociólogo, essa postura demonstra um preconceito contra familiares de pessoas privadas de liberdade.
Oruam se manifestou nas redes sociais em tom de deboche contra a proposta. Em um vídeo publicado nos stories do Instagram, ele respondeu diretamente à vereadora Amanda, dizendo que ela não teria força suficiente para impedir seus shows. O trapper chegou a fazer ameaças veladas, sugerindo que a vereadora não deveria citar seu nome. Após a publicação, Amanda registrou um boletim de ocorrência alegando ter recebido ameaças de morte.
O artista já havia se posicionado anteriormente sobre as críticas que recebe por sua relação familiar e pelo conteúdo de suas músicas. Em uma publicação feita no final de janeiro, ele afirmou que aceita ser um alvo da mídia, pois sempre é necessário haver um “vilão” para justificar problemas maiores da sociedade. Ele também argumentou que o tráfico de drogas é apenas uma parte do problema e que existem questões mais graves que não são debatidas.
Oruam começou sua carreira no trap em 2021 e rapidamente ganhou destaque no cenário musical brasileiro. Nascido e criado no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, ele se tornou uma das principais vozes do gênero no país. Ele já colaborou com artistas como Ludmilla, MC Ryan SP e MC Daniel, acumulando milhões de ouvintes nas plataformas digitais. Algumas de suas músicas mais populares, como “Oh Garota Eu Quero Você Só Pra Mim” e “Diz Aí Qual é o Plano?”, figuram entre as mais tocadas no Spotify Brasil.
A polêmica envolvendo o “PL anti-Oruam” levanta questões sobre os limites entre liberdade artística e responsabilidade pública no financiamento da cultura. Enquanto seus defensores alegam que o projeto visa impedir o uso do dinheiro público para promover conteúdos que fazem apologia ao crime, seus críticos argumentam que a medida pode ser uma tentativa de censura direcionada à cultura periférica. O debate promete se intensificar à medida que o projeto avança no Congresso e as discussões sobre a regulamentação do financiamento público de eventos culturais ganham mais espaço na sociedade.