A denúncia, que já vinha sendo analisada pelos bastidores do Judiciário desde os primeiros meses do ano, foi aceita com o voto favorável de todos os ministros da Primeira Turma. Alexandre de Moraes, relator do caso, foi seguido por Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. A unanimidade no julgamento demonstra o alinhamento da Corte em relação à gravidade dos fatos narrados pela PGR, que apontou para um esforço coordenado de agentes públicos visando romper a ordem constitucional após a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2022.
Os crimes atribuídos aos réus são organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado contra bens da União. As acusações se baseiam em investigações que revelaram movimentações estratégicas, trocas de mensagens, reuniões clandestinas e articulações de caráter militar e político supostamente destinadas a impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. O grupo agora será julgado em um processo criminal com desdobramentos que podem atingir altas patentes e aprofundar a tensão institucional no país.
Entre os denunciados que se tornaram réus estão figuras importantes das Forças Armadas, como o general Estevam Theóphilo e o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto. Também fazem parte da lista Fabrício Moreira de Bastos, Hélio Ferreira Lima, Márcio Nunes de Resende Júnior, Rafael Martins de Oliveira, Rodrigo Bezerra de Azevedo e Ronald Ferreira de Araújo Júnior. Todos são oficiais do Exército, ocupando postos de alta relevância e com acesso privilegiado a estruturas estratégicas do Estado. A presença de nomes de peso nesse grupo levanta questionamentos sobre o grau de envolvimento de setores militares com ações que extrapolariam os limites institucionais.
A denúncia é fruto de um inquérito de ampla dimensão, que vem sendo conduzido pela PGR com o apoio de órgãos de inteligência e segurança. A investigação, segundo fontes da própria Corte, ainda está longe de ser encerrada, e novas fases podem atingir outros envolvidos nos diversos núcleos que supostamente compunham o plano. De acordo com os autos, o núcleo três seria responsável por operacionalizar medidas coercitivas que poderiam sustentar um estado de exceção, incluindo a ocupação de prédios públicos e o bloqueio de vias estratégicas.
A decisão do STF ocorre em um ambiente político e institucional cada vez mais polarizado. Enquanto setores alinhados ao governo e ao Supremo comemoram o avanço do processo como um passo importante para a proteção do regime democrático, aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro acusam a Corte de perseguição e de criminalizar opiniões e estratégias políticas. Para esses críticos, as acusações são exageradas e têm como objetivo desmobilizar a oposição e enfraquecer lideranças conservadoras.
Por outro lado, o ministro Alexandre de Moraes, em declarações recentes, tem reiterado a necessidade de firmeza na defesa da Constituição, afirmando que o Judiciário não se curvará diante de ameaças e tentativas de ruptura. Moraes tem sido o principal protagonista das ações contra grupos identificados como antidemocráticos, sendo alvo de críticas constantes nas redes sociais e por parte de parlamentares da direita. Mesmo assim, o ministro mantém sua linha de atuação, reforçando o discurso de que a democracia brasileira não tolerará retrocessos.
O julgamento desta terça-feira representa mais um capítulo do esforço institucional de responsabilização de atores que, de acordo com as investigações, teriam colocado em risco a estabilidade do país. A tramitação do processo penal será acompanhada de perto por toda a sociedade e por observadores internacionais, já que envolve militares da ativa e da reserva, cujas condutas agora serão avaliadas sob o rigor da legislação penal brasileira. A depender dos desdobramentos, o caso pode vir a influenciar a relação entre os poderes e até provocar revisões na forma como as Forças Armadas se posicionam no cenário político nacional.
Com essa decisão, o Supremo sinaliza que está disposto a seguir até as últimas consequências na responsabilização dos envolvidos. O processo agora entra em nova fase, com instrução probatória, depoimentos, perícias e, eventualmente, julgamento de mérito. Os próximos meses prometem ser intensos para o Judiciário, que carrega nos ombros a missão de zelar por uma democracia ainda marcada por feridas recentes e incertezas quanto à sua resiliência diante das ameaças internas.