Mesmo que o Congresso aprove o texto, caberá ao STF dar a palavra final sobre a validade do perdão. Nos bastidores, ministros ouvidos sob reserva indicam que o projeto pode ser considerado inconstitucional. O principal argumento é que nem todos os crimes podem ser objeto de anistia, e há dúvidas sobre a compatibilidade da proposta com a Constituição Federal. A questão central gira em torno da Lei nº 14.197/2021, que trata de crimes contra o Estado Democrático de Direito, e da própria Carta Magna, que classifica como inafiançáveis e insuscetíveis de anistia os crimes cometidos por grupos armados contra a ordem constitucional e o regime democrático.
A Constituição Federal, no artigo 5º, é clara ao estabelecer que práticas como tortura, tráfico de drogas, terrorismo e crimes hediondos não podem ser objeto de perdão. Além disso, também considera imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Diante disso, há uma grande possibilidade de o STF interpretar que os atos de 8 de janeiro, especialmente os de depredação e invasão das sedes dos Três Poderes, se enquadram nessa categoria, impedindo a concessão da anistia.
A movimentação no Congresso para aprovar a medida ganhou força nos últimos meses, impulsionada por parlamentares da base bolsonarista. O argumento central dos defensores da anistia é que muitas das pessoas presas não participaram ativamente da destruição dos prédios públicos e que a punição imposta pelo Judiciário foi desproporcional. Bolsonaro, por sua vez, tem reiterado que os manifestantes não usaram armas de fogo e que a repressão contra eles foi exagerada. Ele também busca reforçar a narrativa de que há perseguição política contra seus apoiadores.
Para o ex-presidente, a decisão de Hugo Motta de pautar o projeto representa um gesto importante e corajoso. A aliados, Bolsonaro tem elogiado o presidente da Câmara, destacando que, apesar de jovem, ele tem um grande futuro na política. A iniciativa também é vista como uma tentativa de consolidar o apoio da bancada conservadora dentro do Congresso, garantindo maior influência para Motta na condução das pautas da Casa.
O Supremo, no entanto, já indicou que analisará o tema em algum momento, seja antes, durante ou depois da votação no Congresso. Os ministros entendem que a questão vai além de uma decisão política e envolve princípios constitucionais fundamentais. Se a anistia for aprovada, o STF pode ser acionado para avaliar sua validade, e a tendência é que a Corte imponha restrições ou até mesmo derrube integralmente a medida.
O embate entre o Legislativo e o Judiciário sobre a anistia dos réus do 8 de janeiro reflete uma disputa mais ampla sobre o papel de cada poder na definição do futuro político do país. Para o Congresso, aprovar a medida representaria uma vitória da ala bolsonarista e um recado de que há espaço para contestação das decisões tomadas pelo STF até agora. Para a Suprema Corte, barrar a anistia seria reafirmar a força das instituições democráticas e impedir que crimes contra o Estado sejam relativizados.
O desfecho desse processo ainda é incerto, mas uma coisa é clara: a tentativa de anistiar os envolvidos nos atos do 8 de janeiro será um dos temas mais controversos do ano no cenário político brasileiro. O debate promete se estender e gerar novas tensões entre os Poderes, com impactos diretos no clima político e nas estratégias eleitorais para os próximos anos.