Mesmo diante do argumento da defesa, Alexandre de Moraes foi taxativo ao afirmar que a liberação do conteúdo não modifica o centro da acusação feita pela Procuradoria-Geral da República. Para o ministro, os novos dados não introduzem elementos que exijam alterações substanciais na denúncia já apresentada pelo Ministério Público, e, portanto, não há justificativa plausível para suspender a oitiva das testemunhas já marcada. Moraes ressaltou ainda que o processo segue dentro dos parâmetros legais e com prazos adequados, mantendo a linha de condução adotada desde a aceitação da denúncia.
A investigação, que se tornou um dos focos centrais da atuação de Moraes no Supremo, apura se houve ou não a construção de um plano organizado para questionar os resultados da eleição presidencial de 2022, vencida por Luiz Inácio Lula da Silva. O núcleo central da acusação aponta para a existência de articulações entre militares, políticos e influenciadores que teriam buscado, de maneira velada ou explícita, fomentar um ambiente propício à ruptura institucional. Jair Bolsonaro nega qualquer envolvimento e afirma que jamais participou de qualquer plano que visasse subverter a ordem democrática. Segundo ele, tudo não passa de perseguição movida por motivações ideológicas.
A recusa ao pedido da defesa não foi a primeira. Na última terça-feira, os advogados do ex-presidente já haviam protocolado outra petição com o mesmo teor, citando a impossibilidade técnica de revisar tamanha quantidade de dados em tão curto prazo. Eles argumentaram que a defesa está sendo colocada em desvantagem, especialmente diante da estrutura da acusação e do tempo que o Ministério Público teve para organizar seus argumentos. Ainda assim, o STF manteve a posição firme de que não há motivo para postergar o cronograma processual.
Parlamentares da base bolsonarista reagiram de forma crítica à decisão. O deputado federal Gustavo Gayer acusou Moraes de desprezar princípios constitucionais, enquanto o senador Flávio Bolsonaro foi ainda mais direto ao afirmar que seu pai está sendo julgado com base em narrativas e não em fatos concretos. A defesa, por sua vez, sinaliza que poderá recorrer novamente, inclusive a instâncias internacionais, caso entenda que os direitos fundamentais do ex-presidente estão sendo sistematicamente desrespeitados.
A comunidade jurídica, como de costume em processos politicamente sensíveis, encontra-se dividida. Alguns especialistas em direito processual acreditam que a negativa ao pedido da defesa fere o princípio da ampla defesa, especialmente diante do volume inédito de provas. Para outros, porém, Moraes acerta ao garantir a continuidade do processo e preservar a celeridade judicial, uma vez que a essência da denúncia continua inalterada e os elementos centrais da acusação já foram disponibilizados com antecedência suficiente.
Do ponto de vista do Ministério Público, a expectativa é de que as oitivas das testemunhas reforcem os indícios contidos na denúncia original. Entre os depoentes previstos, estão nomes citados como participantes de reuniões, redatores de documentos e intermediários entre grupos supostamente envolvidos nas articulações antidemocráticas. Embora ainda não esteja confirmado, há possibilidade de que Bolsonaro seja convocado a depor em etapas posteriores, dependendo da evolução das investigações e do conteúdo extraído das audiências iniciais.
O ambiente político e institucional, já tenso desde o início do ano, tende a se agravar com a decisão de Moraes. No Congresso, parlamentares de oposição acusam o Supremo de atuar como parte interessada no processo, enquanto governistas evitam comentários diretos, preferindo destacar a importância da responsabilização de atos que atentem contra a democracia. Entre aliados e adversários, cresce a percepção de que o processo que envolve Jair Bolsonaro será um dos grandes testes para o sistema judicial brasileiro nos próximos meses, não apenas pelo conteúdo das acusações, mas pelos desdobramentos políticos que inevitavelmente virão com seu andamento.